Médicos argentinos e brasileiros citam larvicida como causa potencial da
microcefalia
Claire
Robinson
Comentário de Julio Severo: Na semana passada, o indicador mais forte de que a microcefalia tem
causas mais complexas do que diretamente o vírus Zika foi anunciado pelo
presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, conforme reportagem
do jornal Washington Post. Autoridades de saúde da Colômbia, disse Santos, até
agora diagnosticaram 3.177 mulheres grávidas com o vírus Zika, mas os exames
apontaram que nenhum dos bebês em gestação tem microcefalia. Tal resultado
mostra claramente que a epidemia de microcefalia no Brasil não deve ter como
causa direta o vírus Zika. Qual é a causa então? É o que nos dirá a reportagem
abaixo, que, embora eu não concorde plenamente, apesar disso tem pontos muito interessantes para análise:
Um
relatório da organização médica argentina Médicos nas Cidades Fumigadas [1]
desafia a teoria de que a epidemia do vírus Zika no Brasil é a causa do aumento
da doença congênita microcefalia entre recém-nascidos.
O
Ministério da Saúde do Brasil rapidamente ligou ao vírus Zika o aumento nesse
defeito congênito, em que o bebê nasce com uma cabeça anormalmente pequena e
muitas vezes tem danos cerebrais. Contudo, de acordo com Médicos nas Cidades
Fumigadas (MCF), o Ministério da Saúde cometeu falha ao não reconhecer que na
região onde a maioria dos doentes vive, um larvicida químico que produz
má-formação nos mosquitos foi introduzido no abastecimento de água potável em
2014. Esse veneno, Pyriproxyfen, é usado numa campanha governamental com o
objetivo de erradicar mosquitos que transmitem doenças.
O MCF
acrescentou que o Pyriproxyfen é fabricado pela empresa Sumitomo Chemical, uma
“parceira estratégica” japonesa da empresa americana Monsanto. O Pyriproxyfen é
um produto químico que inibe o crescimento das larvas dos mosquitos, alterando
o processo de desenvolvimento das larvas, impedindo-as de chegar à idade
adulta, gerando assim má-formação nos mosquitos em desenvolvimento e matando-os
ou aleijando-os. O Pyriproxyfen age como um hormônio de inseto juvenil ou
juvenoide, e tem o efeito de inibir o desenvolvimento de características de um
inseto adulto (por exemplo, asas e órgãos sexuais externos maduros) e o
desenvolvimento reprodutivo. É um interruptor endócrino e é teratogênico (causa
defeitos congênitos), de acordo com MCF.
O MCF comentou: “Má formações
detectadas em milhares de crianças de mulheres grávidas que vivem em regiões em
que o governo brasileiro adicionou o Pyriproxyfen na água de beber não são
coincidência, ainda que o Ministério da Saúde coloque uma culpa direta no vírus
Zika por esse estrago.”
O MCF
também comentou que o Zika é tradicionalmente considerado uma doença relativamente
benigna que nunca antes teve ligação com defeitos congênitos, até mesmo em
lugares em que infecta 75% da população.
O larvicida é
provavelmente o maior culpado nos defeitos congênitos.
O
Pyriproxyfen é um produto químico introduzido no meio-ambiente do Brasil
relativamente há pouco tempo. O aumento de microcefalia é um fenômeno
relativamente novo. Então o larvicida parece um fator plausível de causa na
microcefalia — muito mais do que os mosquitos geneticamente modificados, que
alguns têm culpado pela epidemia do Zika e assim pelos defeitos congênitos. Não
existe evidência sólida para apoiar a noção promovida por algumas fontes de que
os mosquitos geneticamente modificados podem causar o Zika, que por sua vez
pode causar a microcefalia. Aliás, dos 404 casos confirmados de microcefalia no
Brasil só 17 (4,2%) apresentaram resultado positivo nos testes do vírus Zika.
Especialistas médicos
brasileiros concordam que o Pyriproxyfen é o principal suspeito
O
relatório do MCF, o qual lida com a epidemia de febre dengue no Brasil,
concorda com as conclusões de um relatório separado sobre a explosão de Zika. O
relatório foi feito pela Abrasco, uma organização brasileira de médicos e
pesquisadores de saúde pública.[2]
A
Abrasco também cita o Pyriproxyfen como uma causa provável da microcefalia e
condena a estratégia de usar produtos químicos para combater os mosquitos que
transmitem o Zika. A Abrasco diz que essa estratégia está contaminando o
meio-ambiente e as pessoas e não está reduzindo o número de mosquitos. A
Abrasco sugere que essa estratégia está sendo movida por interesses comerciais
da indústria química, que diz que está profundamente envolvida nos ministérios
de saúde da América Latina e também na Organização Mundial de Saúde e na
Organização Pan-Americana de Saúde.
A
Abrasco cita a Oxitec, uma empresa britânica de insetos geneticamente
modificados, como parte do lobby empresarial que está distorcendo os fatos
sobre o Zika para servir à sua própria agenda de produzir lucros. A Oxitec
vende mosquitos geneticamente modificados projetados para serem estéreis e os
comercializa como produtos que combatem doenças — uma estratégia condenada
pelos médicos argentinos como “fracasso total, exceto para a empresa que supre
os mosquitos.”
Quem sofre mais são os
pobres
As
associações de médicos e pesquisadores brasileiros e argentinos concordam em
que a pobreza é um fator principal negligenciado na epidemia do Zika. A Abrasco
condenou o governo brasileiro por “acobertar deliberadamente” as causas
econômicas e sociais: “Na Argentina e em todo o continente americano as
populações mais pobres com o menor acesso ao saneamento básico e água limpa são
as que mais sofrem com a epidemia.” O MCF concordou, dizendo: “A base da
expansão da doença é a desigualdade e a pobreza.”
A Abrasco
acrescentou que a doença tem ligação íntima com a degradação ambiental:
enchentes causadas por exploração de madeira e o uso imenso de herbicidas em
colheitas de soja geneticamente modificadas para tolerar herbicidas — em
resumo, “os impactos das indústrias extrativistas.”
A
noção de que a degradação ambiental pode ser um fator na propagação do Zika
encontra apoio na opinião do Dr. Dino Martins, um entomologista queniano.
Martins disse que “a explosão de mosquitos em áreas urbanas, que está
impulsionando a crise do Zika,” é causada por “uma falta de diversidade natural
que se estivesse em ordem manteria as populações de mosquitos sob controle, e a
proliferação de resíduos e falta de aterros sanitários em algumas áreas que
fornecem o habitat artificial para reproduzir mosquitos.”
Ações comunitárias
O MCF
acredita que a melhor defesa contra o Zika são “ações comunitárias.” Um exemplo
de tal ação foi apresentado numa reportagem da BBC sobre o vírus da dengue em
El Salvador. Um lugar predileto para os mosquitos transmissores da doença se
reproduzirem são os recipientes de armazenagem de água parada. Os salvadorenhos
começaram a manter peixes nos recipientes, e os peixes comem as larvas dos
mosquitos. A dengue desapareceu junto com os mosquitos que transmitem a doença.
E até agora os salvadorenhos não tiveram nenhum caso de Zika também.
Campanhas
simples, mas eficientes, como essa estão em perigo de serem negligenciadas no
Brasil em favor de campanhas apoiadas por grandes empresas, que querem o uso de
pesticidas e mosquitos geneticamente modificados. O uso dos mosquitos
geneticamente modificados não teve nenhuma comprovação de eficácia e os
pesticidas podem estar causando estragos mais graves do que os mosquitos que
estão sendo visados.
Notas