segunda-feira, 25 de março de 2019

SÍNDROME DE GILBERT, CRIGLER-NAJJAR E DUBIN-JOHNSON

Conheça três doenças de origem genética que costumam causar icterícia

As síndromes de Gilbert, Crigler-Najjar e Dubin-Johnson são três doenças que ocorrem por uma alteração do fígado de origem genética, interferindo no metabolismo normal das bilirrubinas e levando ao surgimento da icterícia.
Antes de falarmos especificamente sobre cada uma dessas síndromes, uma rápida explicação sobre o que são icterícia e bilirrubinas se faz necessária.
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O que são as bilirrubinas e o que causa a icterícia?
Nossas hemácias (glóbulos vermelhos) têm uma vida média de 120 dias. Quando elas ficam velhas, são levadas para o baço onde são destruídas, liberando um pigmento chamado bilirrubina. Este é então transportado para o fígado onde será metabolizado e eliminado nas fezes.
Um dos sinais típicos de doença do fígado é a perda da capacidade do mesmo em metabolizar as bilirrubinas, fazendo com que estas se acumulem no sangue e, posteriormente, se depositem na pele. O excesso de bilirrubina provoca um tom amarelado na pele e nos olhos chamado de icterícia.
Existem dois tipos de bilirrubina: (1) a indireta ou não conjugada, que é aquela que não foi processada pelo fígado, e (2) a direta ou conjugada, que é aquela que já passou pelo fígado mais ainda não foi excretada em direção ao intestino para ser eliminada nas fezes.
A única maneira do corpo eliminar a bilirrubina indireta produzida diariamente pela destruição das hemácias velhas é através da sua conjugação em bilirrubina direta no fígado. Somente a bilirrubina direta consegue ser excretada na bile para ser eliminada nas fezes, impedindo sua acumulação.
A icterícia pode ser causada por acúmulo de bilirrubina indireta quando o fígado não consegue transformá-la em direta ou quando ocorre subitamente uma grande destruição das hemácias, ou direta, quando há alguma obstrução que impeça a eliminação da bilirrubina direta nas fezes. Se quiser saber mais detalhes sobre icterícia e metabolismo das bilirrubinas, sugiro a leitura de ICTERÍCIA NO ADULTO.

Síndrome de Gilbert

A síndrome de Gilbert, também chamada de disfunção hepática constitucional, é uma doença genética que acomete cerca de 5 a 10% da população mundial.
A síndrome de é Gilbert uma doença benigna que não causa maiores problemas de saúde. Ela é causada por um defeito em uma gene chamado UGT1A, responsável pela produção da enzima glucoronil transferase, que por sua vez é responsável pela transformação da bilirrubina indireta em direta. Na síndrome de Gilbert, esta enzima apresenta uma redução na sua atividade em até 80%, acarretando em um acúmulo de bilirrubina indireta no sangue.
Para se ter a síndrome de Gilbert é preciso receber uma cópia defeituosa do gene UGT1A tanto da mãe quanto do pai. Quem recebe uma cópia defeituosa e outra normal, costuma apresentar apenas uma discreta alteração das bilirrubinas e não desenvolve a síndrome completamente. Cerca de 30% da população carrega apenas um gene UGT1A defeituoso e, na maioria das vezes, nem sequer desconfia deste fato.
Sintomas da síndrome de Gilbert
Mesmo naqueles com duas cópias defeituosas do gene, a doença costuma ser assintomática, ou quase. Nestes, os apenas 20-30% de função da glucoronil transferase são suficientes para se manter as bilirrubinas em um nível sanguíneo abaixo dos 3,0 mg/dl, o que não causa uma icterícia facilmente identificável.
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Na maioria dos pacientes com síndrome de Gilbert, a icterícia só ocorre em períodos de estresse, como em jejum prolongado, exercícios físicos extenuantes, doença febril (leia: O QUE SIGNIFICA E POR QUE TEMOS FEBRE ?), desidratação, hemólise (destruição anormal das hemácias) ou, em algumas mulheres, durante o período menstrual.
Muitos casos de Gilbert são descobertos acidentalmente através de análises de sangue de rotina para avaliação da função hepática (leia: O QUE SIGNIFICAM TGO, TGP, GAMA GT e BILIRRUBINA?). O paciente nunca se queixou de nada, mas apresenta níveis de bilirrubina indireta acima dos valores de referência. O resto das análises do fígado (TGO, TGP, Fosfatase alcalina e Gama-GT) encontram-se normais.
Consequências da síndrome de Gilbert
Como já foi dito, a síndrome é benigna e não causa maiores problemas de saúde. Na verdade, atualmente se discute se a pequena e constante elevação da bilirrubinas sanguíneas desta síndrome não é um fator de proteção contra doenças cardíacas e alguns tipos de cânceres. O paciente com síndrome de Gilbert vive tanto quanto qualquer outro e com a mesma qualidade de vida.
Tratamento da síndrome de Gilbert
Não há necessidade de se tratar a síndrome de Gilbert, porém, alguns cuidados são necessários. A mesma enzima glucoronil transferase que transforma a bilirrubina indireta em direta, também é responsável pela metabolização de algumas drogas no fígado, como o anticancerígeno Irinotecan e o antiviral Indinavir.
Não há dieta especial, nem nenhum tipo de atividade restrita para quem tem a síndrome. O consumo de álcool deve ser moderado como em qualquer indivíduo (leia: EFEITOS DO ÁLCOOL E ALCOOLISMO).

Síndrome de Crigler-Najjar

A síndrome de Crigler-Najjar é outra doença genética causada por defeitos no metabolismo das bilirrubinas, Ao contrário da síndrome de Gilbert que é benigna e relativamente comum, a Crigler-Najjar é muito rara pode levar a complicações sérias. Estima-se que ocorra em 1 a cada 1 milhão de nascimentos.
O mecanismo é semelhante ao Gilbert, devido a um defeito na produção da enzima glucoronil transferase, porém, na Crigler-Najjar a sua deficiência é muito mais grave. Na síndrome de Crigler-Najjar tipo 1 há praticamente 0% de glucoronil transferase funcionante, enquanto que na síndrome de Crigler-Najjar tipo 2, a sua função é de apenas 10%.
Sintomas da síndrome de Crigler-Najjar
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Na síndrome de Crigler-Najjar tipo 1, o recém-nascido já apresenta icterícia persistente logo após o nascimento, podendo desenvolver uma intoxicação cerebral pelo excesso de bilirrubinas, chamada de kernicterus, que pode levar à morte. Enquanto no Gilbert a bilirrubina costuma ficar ao redor de 3 mg/dl, na síndrome de Crigler-Najjar tipo 1 esta pode chegar até 50 mg/dl, ultrapassando em muito o limite da toxicidade (leia: ICTERÍCIA NEONATAL – Causas e Tratamento).
Na síndrome de Crigler-Najjar tipo 2, o quadro é mais brando e a icterícia pode surgir após alguns anos de vida. A ocorrência de kernicterus é rara e a bilirrubina costuma ficar ao redor de 10 a 20 mg/dl neste grupo.
Tratamento da síndrome de Crigler-Najjar
Na síndrome de Crigler-Najjar tipo 1 o tratamento deve ser instituído logo após o nascimento na tentativa de se evitar a ocorrência do kernicterus.
A fototerapia é um procedimento onde o recém-nascido é colocado durante 12h por dia sob uma luz azul fluorescente que age quebrando a molécula de bilirrubina em pedaços, facilitando a sua excreção na urina e nas fezes. Deste modo, o corpo consegue reduzir seus níveis de bilirrubina indireta sem precisar conjugá-la em direta.
Este tratamento é realizado a longo prazo e quanto mais velha for a criança, menor sua eficácia devido ao fato da pele ir se tornando cada vez mais grossa conforme ela cresce.
Além da fototerapia, a troca frequente do plasma sanguíneo através de um procedimento chamado plasmaferese também é muito importante no controle dos níveis de bilirrubina (leia: PLASMAFERESE – Para que serve e como ela funciona?).
Estes dois tratamentos descritos acima são apenas temporários uma vez que apenas baixam provisoriamente os níveis de bilirrubina, sem atuar na causa da síndrome. Eles são importantes para evitar o aparecimento do kernicterus, porém, o único tratamento definitivo é o transplante de fígado.
Na síndrome de Crigler-Najjar tipo 2, os 10% de ação da glucoronil transferase costumam ser suficientes para não ocorrer o kerniocterus. Porém, se não há evidente risco de morte e de sequelas neurológicas na maioria dos casos, a icterícia costuma ser exuberante e esteticamente indesejável. Nestes casos, pode-se indicar o uso de fenobarbital, uma droga usada como anticonvulsivante mas que também tem como efeito a redução de até 25% dos níveis de bilirrubinas no sangue.

Síndrome de Dubin-Johnson

A síndrome de Dubin-Johnson também é uma doença genética que cursa com aumento das bilirrubinas e icterícia sem outras alterações nas análises do fígado. Porém, ao contrário das síndromes de Gilbert e Crigler-Najjar, neste caso a bilirrubina que se acumula é direta (conjugada).
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Na síndrome de Dubin-Johnson o fígado consegue conjugar normalmente a bilirrubina indireta em direta, porém, ele é incapaz de secretá-la através da bile para ser eliminada nas fezes.
A síndrome de Dubin-Johnson também é benigna e os níveis de bilirrubinas costumam ser baixos. Não há tratamento específico e o fenobarbital pode ser usado em casos de icterícia mais clinicamente visível.


  • PEDIATRIA
CARDIOLOGIADOENÇAS AUTOIMUNES

DOENÇA DE KAWASAKI – CAUSAS, SINTOMAS E TRATAMENTO

Apesar auto-limitada, a doença de Kawasaki pode provocar graves complicações, como aneurismas, AVC ou infarto do miocárdio.

O que é a doença de Kawasaki

A doença de Kawasaki (DK), chamada inicialmente de síndrome dos nódulos linfáticos mucocutâneos, foi descrita no Japão, em 1967, pelo Dr. Tomisaku Kawasaki, que relatou 50 casos de crianças com quadro de febre, erupções a pele, conjuntivite, aumento dos linfonodos do pescoço, inflamação dos lábios e da língua e edema das mãos e dos pés.
A doença foi inicialmente considerada uma enfermidade benigna, pois ela curava-se espontaneamente após cerca de 12 dias, mesmo quando nenhum tratamento havia sido administrado. Porém, conforme novos casos foram sendo descritos, verificou-se que até 25% das crianças não tratadas desenvolviam sequelas cardíacas e cerca de 2% evoluíam para o óbito.
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A doença de Kawasaki é uma vasculite* que pode provocar lesão em veias e artérias de pequeno e médio calibres em qualquer parte do corpo, mas que atinge de forma mais pronunciada as artérias coronarianas (artérias que nutrem o músculo cardíaco).
* Se você quiser mais explicações sobre o que é uma vasculite, acesse o link: VASCULITE – Causas, Tipos, Sintomas e Tratamento.
A DK é uma doença que ocorre predominantemente em crianças até os 5 anos de idade (80 a 90% dos casos). Apesar de existirem casos em todos os países e em todas as etnias, essa forma de vasculite é muito mais comum nas crianças de origem asiática, principalmente nas japonesas.
Enquanto nos países ocidentais a incidência anual da doença de Kawasaki é baixa, com apenas 10 a 20 casos descritos por cada 100.000 crianças de até 5 anos, no Japão, a incidência é alta, chegando a 250 casos por ano para cada 100.000 crianças. Cerca de 1% das crianças japonesas desenvolvem a doença de Kawasaki ao longo dos primeiros 5 anos de vida.
A doença de Kawasaki no adulto é bastante rara, havendo apenas 100 casos publicados em todo mundo entre 2010 e 2017.

Causas da doença de Kawasaki

A origem da doença de Kawasaki ainda é desconhecida. Estudos epidemiológicos e imunológicos sugerem que o gatilho para a cascata de eventos que acaba por provocar o quadro de vasculite possa ter origem infecciosa. No entanto, a gênese da doença não parece ser assim tão simples e fatores auto-imunes e genéticos também parecem ser necessários para a doença surgir.
A hipótese mais aceita atualmente é a de que um agente infeccioso, seja um vírus ou uma bactéria, possa ativar o sistema imunológico de crianças geneticamente predispostas, provocando uma reação auto-imune contra os vasos sanguíneos (para entender o que é uma doença auto imune, leia: DOENÇAS AUTOIMUNES – Causas, Sintomas e Tratamento).
O mais provável é que esse germes que desencadeiam a doença de Kawasaki provoquem uma infecção assintomática ou pouco sintomática antes da vasculite surgir, motivo pelo qual é difícil estabelecer com certeza a relação da DK com uma infecção prévia.
Alguns dados epidemiológicos importantes dão suporte à teoria da origem infecciosa, entre eles:
  • A doença de Kawasaki é caracterizada por um exantema febril com inflamação dos gânglios linfáticos e da mucosa da boca, manifestações que são semelhantes às de várias doenças contagiosas infantis, tais como sarampo e escarlatina, por exemplo.
  • Existe um aumento sazonal na incidência de DK no inverno e no verão, comportamento que é semelhante ao de várias infecções virais.
  • A doença de Kawasaki ocorre frequentemente em surtos, acometendo uma determinada população em uma restrita área geográfica.
  • No Japão observou-se que os irmãos das crianças com DK apresentam maior risco de também desenvolver a doença, o que geralmente ocorre dentro de uma semana após o início dos sintomas na primeira criança.
  • A doença é comum em crianças menores de cinco anos, mas é rara naqueles menores de seis meses. Esse fato pode ser explicado pela presença de anticorpos maternos ainda circulantes no organismo do bebê nos primeiros meses de vida, o que impediria a sua contaminação pelos germes desencadeadores.
Entre os vírus e bactérias que podem desencadear a doença de Kawasaki, alguns agentes suspeitos são:
  • Parvovírus B19.
  • Meningococo.
  • Mycoplasma pneumoniae.
  • Klebsiella pneumoniae.
  • Adenovírus.
  • Citomegalovírus.
  • Vírus Parainfluenza.
  • Rotavírus.
  • Vírus do sarampo.
  • Vírus de Epstein Barr.
  • Vírus linfotrópico humano.
  • Rickettsias.

Sintomas da doença de Kawasaki

O quadro clínico da doença de Kawasaki é habitualmente dividido em 3 fases: aguda, subaguda e convalescência, conforme o gráfico abaixo ilustra.
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Sintomas da doença de Kawasaki
Fases da doença de Kawasaki

1. Fase aguda

Febre
Febre alta, acima de 38,5ºC, de início súbito e que responde mal aos antipiréticos, é o primeiro e o mais comum sinal da doença de Kawasaki. Se não for tratada, a febre costuma se prolongar por vários dias, às vezes até semanas.
Conjuntivite
Poucos dias após o surgimento da febre, 90% das crianças começam a apresentar conjuntivite bilateral, que costuma provocar vermelhidão mais intensa na parte lateral dos olhos, com pouca ou nenhuma secreção amarelada. 70% dos pacientes com acometimento ocular desenvolvem também uveíte anterior, que é a inflamação da íris ao redor da pupila.
Mucosite
Mais ou menos na mesma época em que surge a conjuntivite, o paciente também costuma desenvolver mucosite, que é a inflamação da mucosa da boca. Os lábios ficam avermelhados e rachados, enquanto a língua fica inflamada e com as papilas bem evidentes, adquirindo um aspecto típico chamado de “língua em morango”, conforme ilustrado na imagem que abre o texto.
Ao contrário da conjuntivite, que ocorre em praticamente todos os casos, a mucosite pode não estar presente em todos os pacientes ou pode ser muito branda, passando quase despercebida.
Rash
Também nos primeiros dias de febre, em cerca de 70% dos pacientes costuma surgir um rash de pele na região genital, perianal e no tronco.
Linfadenite cervical
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A linfadenite cervical (aumento dos linfonodos no pescoço) costuma estar presente em 25 a 50% dos casos. A maioria dos pacientes apresenta um único linfonodo aumentado na região anterior do pescoço.
Artrite
artrite costuma aparecer em apenas 10% dos pacientes. As articulações habitualmente mais acometidas são os tornozelos, joelhos e quadril.
Manifestações cardíacas
miocardite (inflamação do músculo cardíaco) e a pericardite (inflamação do pericárdio) costumam ser a complicações que surgem na fase aguda da doença de Kawasaki. Arritmias e lesões nas válvulas cardíacas também podem surgir.
Ao ecocardiograma, alguns pacientes com miocardite já apresentam nos primeiros dias sinais iniciais de insuficiência cardíaca.
Mãos e pés
Vermelhidão e inchaço nas nas palmas das mãos e na planta dos pés costumam ser a última manifestação a surgir na fase aguda. A lesão nos pés pode fazer com que a criança tenha dificuldade para andar.
Outros sinais e sintomas
Nos primeiros 10 dias de doença, o paciente pode apresentar também:
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  • Diarreia, vômitos ou dor abdominal – 61%.
  • Irritabilidade – 50%.
  • Vômitos isoladamente – 44%.
  • Perda do apetite – 37%.
  • Tosse – 35%.
  • Dor nas articulações (sem sinais de artrite) – 15%.

2. Fase subaguda

A fase subaguda inicia-se quando a febre desaparece, fato que costuma ocorrer ao redor do 10º dia, e dura até a 4ª ou 6ª semana. O não desaparecimento da febre após 2 semanas costuma ser um sinal de mau prognóstico, pois está mais associado a complicações cardíacas.
A manifestação característica da fase subaguda é a descamação dos dedos, que habitualmente começa nas extremidades e vai se alastrando por todas as mãos e pés. Outro achado típico é o surgimento de aneurismas nas artérias coronarianas, provocados pela inflamação dos vasos sanguíneos.
Sinais e sintomas iniciados na fase aguda, tais como vômitos, diarreia, irritabilidade e dor articular, podem ainda estar presentes nessa fase seguinte da doença.
Laboratorialmente, o paciente apresenta uma grande elevação na contagem de plaquetas (trombocitose), que pode ultrapassar o valor de 1 milhão de células por microlitro, aumentando muito o risco de formação de trombos nos vasos sanguíneos (trombose).
Os valores de VHS e de proteína C reativa (PCR) também costumam estar bem elevados.

3. Fase de convalescência

A fase de convalescência é marcada pela resolução completa dos sintomas da doença, fato que geralmente acontece no prazo de 3 meses.
Durante este estágio, podem surgir sulcos transversais nas unhas, chamadas de linhas de Beau.
Na fase de convalescência, os pequenos aneurismas da artéria coronária tendem a se resolver espontaneamente. Já os aneurismas maiores, por sua vez, podem se expandir e provocar infarto do miocárdio.

Critérios diagnósticos

Não existe um exame laboratorial ou de imagem que sozinho consiga estabelecer o diagnóstico da doença de Kawasaki. Sendo assim, o diagnóstico, em geral, é feito através da avaliação conjunta da história epidemiológica, dos sintomas e dos resultados dos exames complementares.
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Os critérios diagnósticos estabelecidos pelo Dr. Tomisaku Kawasaki em 1967 ainda são utilizados hoje em dia.
Para que uma criança de até 5 anos tenha o diagnóstico da DK, ela precisa apresentar um quadro de febre por pelo menos 5 dias, associado a pelo menos quatro dos seguintes cinco achados físicos:
  • Conjuntivite bilateral.
  • Inflamação da mucosa oral.
  • Inflamação e edema de mãos e pés.
  • Rash característico.
  • Linfadenopatia cervical (pelo menos um linfonodo maior que 1,5 cm de diâmetro).
O ecocardiograma é um exame que não faz parte dos critérios diagnósticos, mas é útil para identificar precocemente as complicações cardíacas.

Tratamento da doença de Kawasaki

O tratamento precoce da doença de Kawasaki é essencial para reduzir o risco de complicações.
A administração de imunoglobulina intravenosa em dose única ainda nos primeiros 10 dias doença é a principal medida terapêutica.
Se o diagnóstico não tiver sido feito nos primeiros 10 dias, mas o paciente ainda apresentar sinais de inflamação sistêmica ativa, tais como febre alta e PCR elevada, a imunoglobulina ainda pode ser administrada, mesmo após o 10º dia de doença.
A aspirina em doses elevadas costuma ser utilizada na fase aguda, pois ela além de ter efeito anti-inflamatório e antipirético também inibe a ação das plaquetas, diminuindo o risco de trombose.
A taxa de mortalidade  dos pacientes tratados é baixa (0,1 a 0,3%). Os raros casos fatais ocorrem quando há envolvimento cardíaco grave, que geralmente resultam em infarto do miocárdio, arritmias ou ruptura de aneurisma. Esses casos geralmente ocorrem quando o diagnóstico não é feito precocemente e o tratamento não é administrado nos primeiros 10 dias de doença.

ESCLERODERMIA – CAUSAS, SINTOMAS E TRATAMENTO

A esclerodermia é uma doença autoimune e inflamatória da pele.

A esclerodermia, cujo nome é derivado das palavras gregas skleros (endurecido) e derma (pele), é um doença de pele de origem autoimune, caracterizada, como o próprio nome sugere, por um progressivo enrijecimento da pele.
Quando além das características lesões da pele, o paciente também envolvimento de vasos sanguíneos e órgãos internos, chamamos a doença de esclerose sistêmica. Muitos médicos, porém, utilizam os termos esclerodermia e esclerose sistêmica de forma intercambiável.
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O fato é que a esclerodermia pode ser considerada um conjunto de doenças que apresentam manifestações clínicas distintas, mas que estão ligadas pela presença do enrijecimento da pele.
Neste artigo vamos explicar o que é a esclerodermia, quais são os seus subtipos, os sintomas característicos e quais são as opções de tratamento.

O que é a esclerodermia

A esclerodermia é uma doença relativamente rara, que acomete cerca de 200 a 300 pessoas a cada 1 milhão de habitantes. Sua origem é autoimune, ou seja, é uma doença na qual o nosso sistema imunológico de forma inapropriada ataca as nossas próprias células (para saber mais sobre as doenças autoimunes, leia: DOENÇA AUTOIMUNE – Causas, Sintomas e Tratamento). O mecanismo exato de como a doença se desenvolve é bem complexo e ainda não está totalmente esclarecido. Sabemos, porém, que a doença é o resultado de três processos patológicos distintos:
1- Lesões inflamatórias das pequenas artérias e arteríolas.
2- Anormalidades na resposta imunológica frente a essas lesões vasculares.
3- Produção excessiva de colágeno, que se deposita na pele e nos órgãos internos, levando ao seu espessamento e enrijecimento.
Não sabemos ainda o motivo pelo qual a esclerodermia surge, mas a suscetibilidade genética parece desempenhar um papel relevante. O problema é que a genética sozinha não é suficiente para que a doença surja. A teoria atualmente mais aceita é a de que pessoas geneticamente susceptíveis, ou seja, pessoas que carregam determinados genes, quando são expostos a determinados fatores ambientais, sejam eles infecções ou substâncias químicas, ativam o gatilho que desencadeia os processos patológicos que levam, em última análise, à esclerose sistêmica.
Algumas bactérias e vírus podem apresentar proteínas que são semelhantes àquelas presentes no nosso corpo. Em pessoas susceptíveis, o sistema imunológico pode tentar criar anticorpos contra essas proteínas virais ou bacterianas, mas, de forma equivocada, acaba por criar anticorpos contra as nossas próprias proteínas. Infecções por citomegalovírus, parvovírus B19 e herpes vírus 5 são alguns dos gatilhos sugeridos.
O mesmo processo pode ser desencadeado pela exposição ocupacional a certas substâncias químicas, como a sílica ou produtos derivados do petróleo (cloreto de vinila, tricloroetileno, tolueno, resinas, benzeno ou tetracloreto de carbono). Também há relatos de desenvolvimento de esclerodermia em pacientes submetidos à quimioterapia com bleomicina.

Classificação da esclerodermia

A esclerodermia costuma ser dividida em duas formas, de acordo com o grau de acometimento dos órgãos internos:
1- ESCLERODERMIA LOCALIZADA
A esclerodermia localizada é uma doença que se restringe à pele, podendo em alguns casos se estender até músculos, articulações e ossos. A esclerodermia localizada não apresenta envolvimento de órgão internos nem lesões vasculares graves.
A esclerodermia localizada é subdividida em:
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a) Esclerodermia linear – é uma forma comum em crianças, caracterizada por lesões de espessamento da pele em bandas ou linhas, que são localizadas no tronco ou membros e costumam ficar restritas a apenas uma metade do corpo. Uma forma típica de esclerodermia linear é a chamada lesão em “golpe de sabre”, que é um espessamento da pele que costuma surgir na região do crânio e parece ter sido feito por um golpe de espada.
Esclerodermia localizada
Fonte: Scleroderma Foundation
b) Morféia – é a forma clínica mais comum e se apresenta como zonas de pele espessada, geralmente de forma oval, com centro mais esbranquiçado e bordas violáceas. Com o tempo, as lesões podem se tornar mais acastanhadas. Estas lesões surgem com mais frequência no tronco e nos membros.
A morféia generalizada é uma forma mais grave, com múltiplas placas espessadas que acometem extensas áreas da pele, que podem ter uma coloração mais esbranquiçada ou amarelada, sendo habitualmente mais claras que as áreas de pele saudável.
2- ESCLEROSE SISTÊMICA
A esclerose sistêmica é a forma mais grave da doença, havendo não só acometimento da pele, mas também de vasos sanguíneos e órgãos internos. A esclerose sistêmica pode ser subdividida em três formas:
a) Esclerose sistêmica cutânea difusa – Além do acometimento da pele, que costuma ser bastante difuso, porém restrito às regiões centrais do corpo, como tronco e início dos membros, essa forma de esclerodermia também pode afetar vários órgãos internos, como pulmões, coração, sistema gastrointestinal e rins. Este tipo de esclerodermia é bem grave e, se não for tratada, costuma ser fatal.
b) Esclerose sistêmica cutânea limitada – Nessa forma de esclerodermia, o acometimento da pele costuma ser mais periférico, ficando restrito a mãos, antebraços, pernas, face e pescoço. Partes centrais, como tronco, braços e coxas costumam ser poupados.
O atingimento dos órgãos internos costuma ser mais tardio e tende a ficar confinado, quase sempre, ao tubo digestivo e aos pulmões. A esclerose sistêmica cutânea limitada costuma causar a chamada síndrome CREST, que é um acrônimo em inglês para as seguintes complicações: Calcinose (depósitos de cálcio na pele); fenômeno de Raynaud (alterações vasculares que provocam isquemia e mudanças temporárias na cor dos dedos), Esôfago (alterações na motilidade do esôfago), eSclerodactilia (Sclerodactyly em inglês – espessamento e enrijecimento da pele dos dedos, como na foto que abre este artigo) e Telangiectasias (vasos capilares finos, vermelhos ou violáceos que se aglomeram na superfície da pele).
c) Esclerose sistêmica sine esclerodermia – É uma forma rara, na qual o paciente tem o quadro de esclerose sistêmica, mas sem o acometimento da pele.

Sintomas da esclerodermia

Os sintomas da esclerodermia dependem da forma de doença que o paciente tem.
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1- Sintomas da esclerodermia localizada
Na esclerodermia localizada, os sintomas praticamente se restringem à pele. A maioria dos pacientes com morfeia desenvolve apenas uma ou duas lesões, que consistem em espessamento, enrijecimento e mudanças de cor da pele. Essas alterações podem durar anos, mas tendem a melhorar. Essa forma de esclerodermia é branda e o prognóstico a longo prazo é muito bom, pois a doença torna-se inativa, ficando o paciente curado.
Na morféia generalizada, o número de lesões de pele é maior e elas tendem a se confluir, acometendo grandes áreas do corpo. Lesões que causam desfiguração podem ocorrer, e mesmo quando há melhora espontânea após alguns anos, as manchas tendem a ser persistentes.
A esclerodermia linear é mais comum em crianças e adolescentes. Cerca de 80% dos pacientes têm menos de 20 anos. A cada 5 pessoas acometidas, 4 são mulheres.
A esclerodermia linear tem um potencial de complicações maior que a morféia. O espessamento da pele pode ser profundo, o que em crianças pode comprometer o crescimento de ossos e articulações. A esclerodermia linear costuma permanecer ativa por dois a cinco anos, mas em alguns pacientes ela pode durar mais tempo. A esclerodermia em golpe de espada é a forma que tem maior potencial de provocar lesões desfigurantes, pois ela afeta preferencialmente a face e o crânio.
Ao contrário da morféia, a esclerodermia linear pode recorrer mesmo após um longo período de inatividade.
2- Sintomas da esclerose sistêmica
Também na esclerose sistêmica os sintomas cutâneos são os mais comuns. Entre eles, um que está presente em quase todos os casos é o chamado fenômeno de Raynaud.
O fenômeno de Raynaud é distúrbio vascular, definido como alterações sequenciais de cor que ocorrem geralmente nos dedos das mãos, precipitados por frio, estresse ou simplesmente mudanças de temperatura ambiente. As alterações de cor seguem a seguinte ordem:
1- Palidez: a mão fica mais branca por uma súbita vasoconstrição arterial, que diminui o aporte de sangue.
2- Acrocianose: a mão fica azulada ou arroxeada, conforme a falta de sangue vai se prolongando.
3- Hiperemia de reperfusão: a mão fica avermelhada e quente devido à súbita vasodilatação e restabelecimento da circulação normal de sangue.
O fenômeno de Raynaud pode surgir vários anos antes do início dos sintomas da esclerose sistêmica cutânea limitada. Já na esclerose sistêmica cutânea difusa, o seu surgimento costuma ocorrer junto com o restante do quadro clínico. Em alguns casos, a fase de isquemia pode ser grave e levar à necrose das pontas dos dedos.
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É importante destacar que o fenômeno de Raynaud também pode ocorrer em pessoas que não tenham esclerodermia.
Além do Raynaud, outras alterações de pele da esclerose sistêmica são:
  • Espessamento e enrijecimento da pele, criando um aspecto de pele lisa, brilhante e dura.
  • Coceira – mais comum nos estágios iniciais da doença.
  • Inchaços – também mais comum nos estágios iniciais da doença.
  • Hiperpigmentação ou despigmentação da pele ( pele em “sal e pimenta”).
  • Perda de cabelo.
  • Esclerodactilia.
  • Úlceras nos dedos.
  • Dor na ponta dos dedos.
  • Telangiectasias.
  • Calcinose cutânea.
Além da lesão de pele, que é praticamente universal a todos os tipos de esclerodermia, o paciente com esclerose sistêmica também costuma apresentar uma gama de outros sintomas. Entre os mais comuns, podemos citar:
  • Fadiga (76%).
  • Rigidez das articulações (74%).
  • Perda de força (68%).
  • Dor (67%).
  • Dificuldade para dormir (66%).
Em relação ao acometimento dos órgãos, os mais comuns são:
  • Alterações da motilidade do esôfago, com dificuldade para engolir.
  • Esofagite.
  • Refluxo gastroesofágico.
  • Diarreia.
  • Prisão de ventre.
  • Incontinência fecal.
  • Hemorragia digestiva.
  • Doença intersticial pulmonar.
  • Hipertensão pulmonar.
  • Câncer de pulmão.
  • Insuficiência renal aguda.
  • Hipertensão maligna.
  • Arritmias cardíacas.

Tratamento da esclerodermia

Não existe tratamento que leve à cura da esclerodermia. Como já referido as formas limitadas à pele podem ter regressão espontânea após alguns anos.
Já a esclerose sistêmica é uma doença de evolução lenta, mas permanente. O seu tratamento tem como objetivo aliviar os sintomas e reduzir a atividade da doença.
Os fármacos utilizados dependem dos sintomas que o paciente têm, por exemplo:
  • Vasodilatadores, como a nifedipina, costumam ser usados para tratar o fenômeno de Raynaud.
  • Inibidores da bomba de prótons, como o omeprazol, ajudam nos sintomas gástricos e do refluxo.
  • Anti-inflamatórios e corticoides em doses baixas ajudam na dor e na rigidez articular.
  • Imunossupressores, como metotrexate ou micofenolato mofetil, ajudam a reduzir os danos da pele e órgãos causados pelo sistema imunológico.
  • Anti-hipertensivos para tratar a hipertensão.
Não existe nenhum tratamento que seja universal para todos os tipos de esclerodermia. Cada tratamento deve ser instituído de forma individual, de acordo com os sintomas e o tipo de envolvimento de órgão existente em cada paciente.