Recomendações para vacinação em pacientes com esclerose múltipla, incluindo gripe H1N1
A esclerose múltipla, a neuromielite óptica e as demais doenças desmielinizantes estão dentre as condições neurológicas crônicas que possuem indicações específicas para vacinação, inclusive para a influenza. Algumas particularidades como o uso de medicamentos imunossupressores ou ocorrência de surtos recentes exigem cuidados adicionais. Estes e outros detalhes você confere no texto a seguir.
Classificação das vacinas existentes
Podemos classificar as vacinas de diferentes formas. Talvez a forma mais didática seria dividi-las em dois grandes grupos: as atenuadas e as inativadas. Ambas podem ser contra vírus ou bactérias. Esta classificação é importante, pois pessoas com esclerose múltipla podem ter sua condição exacerbada após o uso de vacinas atenuadas, devendo em geral evitá-las.
Vacinas atenuadas são compostas de bactérias ou vírus ainda vivos, mas sem capacidade de produzir doença. Mesmo assim podem se replicar e produzir imunidade, parecida com a resposta formada após uma infecção natural. Em geral, esse tipo de vacina é efetivo com apenas uma única dose e oferece proteção longa.
São exemplos de vacinas atenuadas virais as vacinas contra: sarampo, caxumba, rubéola, varicela, febre amarela, rotavírus e poliomielite (oral). Algumas vezes estes vírus podem reverter para a forma selvagem causando a doença, sendo estas vacinas contraindicadas para imunodeprimidos e gestantes. No caso da esclerose múltipla, podem exacerbar a doença.
Dentre as vacinas atenuadas bacterianas, podemos citar as vacinas contra tuberculose (BCG) e contra a febre tifoide (oral).
Já as vacinas inativadas contêm o vírus ou bactéria mortos (inativados) por processos químicos ou físicos ou então apenas fragmentos destes. Comparada à intensidade e duração das respostas obtidas com vacinas atenuadas, este tipo fica em desvantagem e, por isso, são necessárias várias doses de reforço para garantir a cobertura vacinal.
Alguns exemplos das vacinas inativadas virais são as vacinas contra influenza (incluindo H1N1), poliomielite (injetável), hepatite A, hepatite B, raiva e papiloma vírus (HPV). Dentre as vacinas inativadas bacterianas, podemos citar as vacinas contra tétano, difteria, febre tifoide (parental), coqueluche e cólera.
Influenza
Os vírus influenza são transmitidos facilmente por aerossóis produzidos por pessoas infectadas ao tossir ou espirrar. Existem três tipos de vírus influenza: A, B e C. O vírus influenza C causa apenas infecções respiratórias brandas, não possuindo impacto na saúde pública. O vírus influenza A e B são responsáveis por epidemias sazonais, sendo o vírus influenza A responsável pelas grandes pandemias. Os vírus influenza A são ainda classificados em subtipos de acordo com as proteínas de superfície hemaglutinina (H) e neuraminidase (N). Dentre os subtipos de vírus influenza A, os subtipos A(H1N1) e A(H3N2) circulam atualmente em humanos. Alguns vírus influenza A de origem aviária também podem infectar humanos causando doença grave, como no caso do A(H7N9).
As vacinas utilizadas nas campanhas nacionais de vacinação são vacinas trivalentes que contêm os antígenos purificados de duas cepas do tipo A e uma B, sem adição de adjuvantes, sendo sua composição determinada pela OMS para o hemisfério sul, de acordo com as informações da vigilância epidemiológica. A vacina tetravalente – encontrada em clínicas privadas – protege das três cepas e ainda de uma cepa de vírus B adicional.
Considerações gerais
Deve-se ter em mente que as recomendações sobre a utilização de vacinas podem variar de caso para caso, sendo que as decisões sobre os potenciais benefícios e riscos de qualquer imunização devem ser feitas em consulta com seus médicos assistentes.
Em linhas gerais:
Considerações especiais
Durante a ocorrência de surtos (recaídas) que tenham sintomatologia que afetem a capacidade de levar as atividades do dia a dia, deve-se esperar por 4 a 6 semanas do início dos sintomas para se vacinar.
Vacinas inativadas são consideradas geralmente seguras para pessoas com esclerose múltipla, incluindo aqueles que estejam em tratamento com interferons (Avonex®, Betaferon®, Rebif®), Copaxone®, ou com os novos medicamentos orais Gilenya®, Aubagio®, Tecfidera®, ou ainda com os injetáveis Tysabri®, Lemtrada® ou Novantrone.
Vacinas de vírus vivos atenuados geralmente não são recomendadas para indivíduos com esclerose múltipla em função da sua capacidade de causar doença ter sido amenizada, mas não abolida.
Indivíduos em tratamento com medicamentos imunossupressores clássicos como ciclofosfamida, azatiprina (Imuran®), mitoxantrona (Novantrone) e / ou corticosteroides cronicamente, devem consultar seu neurologista antes de tomar qualquer vacina de vírus vivo.
Indivíduos que estejam em tratamento com Lemtrada® não devem receber vacinas de vírus vivo.
Não há consenso entre os especialistas sobre os riscos para uma pessoa com esclerose múltipla cujo membro próximo da família tenha recebido vacina de vírus vivo. A família deve discutir com o neurologista como melhor abordar esta questão.
A vacina inativada contra influenza (gripe), incluindo H1N1, é recomendada pelo CDC (Centers for Disease Control and Prevention) norte americano para todos os indivíduos maiores de seis meses de idade. A vacina foi extensivamente investigada em indivíduos com esclerose múltipla e é considerada bastante segura, independentemente da medicação modificadora de doença que estejam utilizando. Uma ressalva é para os pacientes em tratamento com Lemtrada®, que devem receber a dose da vacina seis semanas antes da infusão da medicação.
Evite exposição a vacinas que estejam fora das recomendações do Ministério da Saúde. Um exemplo é a vacina FluMist® contra gripe, encontrada nos EUA, composta de vírus vivo atenuado e empregada via spray nasal. Esta vacina não é recomendada para pessoas com esclerose múltipla.
Vacina contra Herpes zoster. Apesar de ser uma vacina atenuada, pode ser considerada para utilização por pessoas com esclerose múltipla, sendo uma exceção para este tipo de vacina. Em geral não se recomenda vacinas atenuadas para pessoas com esclerose múltipla, em função de poderem levar a aumento da atividade inflamatória e novos surtos. Esta exceção se dá em função da maioria das pessoas ter tido varicela (catapora) quando mais nova, possuindo ainda os vírus consigo. Cada um deve discutir os riscos e benefícios desta vacina com seu médico assistente.
Vacina contra varicela. Esta vacina deve ser considerada em pessoas com esclerose múltipla que nunca tiveram catapora, que nunca se vacinaram previamente e que estejam considerando tomar uma medicação para esclerose múltipla que tenha o potencial de suprimir a imunidade celular, como Gilenya® (fingolimode) e Lemtrada™ (alemtuzumabe). A vacina deve ser tomada seis semanas antes de se iniciar o tratamento
Thiago Junqueira
Doutorado em Ciências (Neurologia) pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. É atualmente Professor Adjunto do curso de Medicina da Escola Bahiana de Medicina. Em sua formação possui Pós-graduação em Nutrologia pela ABRAN. Membro Titular da Academia Brasileira de Neurologia.