Para que serve o exame de líquor?
Utilizado desde o final do século XIX, o exame de líquor é de grande importância no diagnóstico de doenças neurológicas, como neuroinfecções, doenças inflamatórias do sistema nervoso, doenças neurovasculares, demências e neoplasias que atingem, de forma direta ou indireta, o sistema nervoso.
O procedimento de coleta para exame de líquor, com a introdução de uma agulha na região lombar (em geral entre a terceira, quarta e quinta vértebras lombares), é bastante seguro quando feito por profissionais capacitados.
Veja a seguir quais são as principais características deste fluído corporal, como a coleta do líquor é realizada e quais os diagnósticos que podem ser realizados a partir do exame de líquor.
O que é líquor?
Líquor, ou líquido cefalorraqueano (LCR), é um líquido produzido nos ventrículos laterais (cavidades localizadas no interior do cérebro). Sua principal função é fornecer uma barreira mecânica e imunológica, protegendo o sistema nervoso central (SNC).
O volume normal do líquor em um adulto é de cerca de 150 ml. Levemente alcalino, sua composição é de 99% de água, e em adultos, a sua produção é contínua e equivale a três vezes o volume total de LCR, ou seja, cerca de 450ml/24 horas.
Qual a finalidade do exame de líquor?
A análise do exame de líquor é de fundamental importância no diagnóstico de inúmeras doenças que afetam o sistema nervoso. .
Algumas doenças aumentam a pressão intracraniana, como a hipertensão intracraniana idiopática (pseudotumor cerebral), uma doença neurológica que causa cefaleia (dor de cabeça) e que pode levar à perda visual, se não tratada.
No momento da coleta do LCR é possível medir a pressão intracraniana e fazer o diagnóstico desta doença, permitindo o rápido início do tratamento.
Além da mensuração da pressão intracraniana, a coleta auxilia no diagnóstico rápido através análise da aparência do LCR. Em condições normais o LCR é límpido e incolor (transparente), com aspecto de “água de rocha”. Quando apresenta-se turvo é indicativo de uma infecção (meningite). Quando o aspecto é hemorrágico, indica uma um sangramento no SNC. Quanto está xantocrômico (coloração amarelada), sugere sangramento prévio ou um bloqueio no fluxo liquórico.
Após a coleta, o LCR é encaminhado para o laboratório especializado para a realização de análise de diversos parâmetros (contagem e análise das células, parâmetros bioquímicos, imunológicos e moleculares). Com essa análise são obtidas informações relevantes para o diagnóstico de diversas doenças:
- Infecções:
o Meningites (causadas por vírus, bactérias, fungos, parasitas)
o Encefalites (infecção do tecido cerebral, sendo também causada por inúmeros agentes infecciosos como, por exemplo, diferentes tipos de vírus)
o Infecções da medula (mielites)
o Neurotuberculose
o Neurosífilis
o Complicações infecciosas em pacientes com deficiência imunológica
o Neurocisticercose (associada à teníase do porco)
o Doenças neuroinfecciosas raras
- Doenças inflamatórias
o Esclerose Múltipla (o exame de líquor é indispensável para esse diagnóstico)
o Outras doenças desmielinizantes do SNC como a Neuromielite Óptica e a Doença associada ao MOG)
o Vasculites (inflamação dos vasos cerebrais)
o Encefalites autoimunes (causadas por anticorpos que afetam o funcionamento do cérebro)
o Neuropatias autoimunes (causadas por anticorpos que atacam os nervos periféricos)
- Cefaleias e Doenças vasculares do SNC
o Hemorragia meníngea (ruptura de aneurisma cerebral)
o Pseudotumor cerebral
o Exclusão de causas graves de cefaleias
- Demências (distúrbios com perda progressiva da memória)
o Doença de Alzheimer
o Causas mais raras de demências (Doença de Creutzfeldt-Jakob, uma doença rara que causa uma demência de rápida evolução)
o Demências de causa infecciosa ou inflamatória
- Neoplasias
o Neoplasias hematológicas que infiltram o SNC e meninges
o Metástases de tumores sólidos que infiltram o SNC e meninges
o Tumores do cérebro ou da medula
Dependendo da suspeita clínica, o laboratório de LCR realiza a análise, incluindo testes especificamente direcionados para o diagnóstico de cada uma destas diferentes doenças ou grupos de enfermidades.
Portanto, o exame de líquor não é um procedimento igual para todos os pacientes. Sendo assim, a análise eficaz do LCR requer:
- Coleta por profissional capacitado não apenas a obter o LCR, mas também para interpretar os parâmetros obtidos na punção,
- Análise adequada dos parâmetros celulares e bioquímicos do LCR,
- Utilização de testes imunológicos moleculares específicos e sofisticados, quando necessário e de acordo com a suspeita clínica ,
- Interpretação clínica adequada de todos os parâmetros obtidos na punção e análise do LCR para a elaboração das hipóteses diagnósticas
Como funciona a coleta do líquor?
A coleta para exame de líquor é realizada por um médico que recebe um treinamento específico para a realização deste procedimento.
O paciente é colocado em posição de decúbito lateral, com os joelhos dobrados contra o peito, de acordo com a orientação do médico. Pode ser utilizado anestésico local.
O local é identificado pelo médico com expertise na realização da punção, e, a seguir procede-se à antissepsia da área da punção. Uma vez coletado, o LCR é armazenado em tubos próprios e enviado rapidamente para análise.
O que fazer antes e após o exame de líquor?
Não há necessidade de permanecer em jejum antes do exame de líquor. A coleta é um procedimento bastante seguro, contudo, o médico sempre deve excluir potenciais contraindicações.
Neste sentido, frequentemente há necessidade de análise prévia de exames de imagem, como uma tomografia ou ressonância do cérebro.
Há necessidade de avaliar o uso de medicamentos que podem interferir na coagulação, aumentando o risco de sangramento. Para tanto devem ser respeitados protocolos específicos a depender do medicamento em uso. Além disso, doenças locais da coluna podem também interferir no procedimento da punção.
Após a coleta do LCR, pode ocorrer tontura e, em alguns casos, cefaleia. O paciente deve permanecer em repouso por 24 horas após a coleta do LCR. A cefaleia pós punção do LCR pode ocorrer em cerca de 10-15% dos pacientes e caracteriza-se por uma dor de cabeça quando o paciente fica de pé.
O uso de agulhas finas e mais modernas e o repouso após o exame reduzem o risco desta cefaleia. Outros incômodos que podem surgir após a coleta são dor na região lombar, principalmente no local da punção e dores nas pernas, principalmente em crianças.
Portanto, a coleta do LCR para exame de líquor é bastante segura se feita de forma adequada. Considerando que o organismo produz e absorve todo o volume de LCR três vezes por dia, a quantidade retirada não causará nenhum dano no cérebro e medula.
Não há nenhum risco da agulha lesar a medula, pois, a medula não tem relação anatômica com o local da punção (a medula termina e a primeira e segunda vértebras lombares e a punção é feita em geral entre a terceira e a quarta).
Leia também: A importância da coleta especializada do Líquido Cefalorraqueano (LCR)
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